alumbramentos

6.24.2005

BRINCAR DE PENSAR

"O melhor modo é convidar os amigos apenas para uma visita e, como quem não quer nada, pensa-se junto, no disfarçado das palavras (...) Pois para pensar fundo - que é o grau máximo do hobby - é preciso pensar sozinho (...) e só se tem coragem de pensar na frente de outrem quando a confiança é grande (...) Além do mais, exige-se muito de quem nos assiste pensar: que tenha um coração grande, amor, carinho, e a experiência de também se ter dado ao pensar. Exige-se tanto de quem ouve as palavras e os silêncios - como se exigiria para sentir. Não, não é verdade. Para sentir exige-se mais".

(ela de novo: Clarice Lispector)

6.16.2005

toc toc

Hei, tem alguém aí??

sós

"Estamos sob o mesmo teto"
Sobre o ventre uma mão áspera, não foi carinho, foi acidente,"secreto".
Dois corpos que não se enlaçam - reta e e meia lua - um arco.
"onde o sol indesejável é barrado"
Não os dedos extensão das mãos tocavam os braços dele, mas a vontade extensão dos sentidos, "eu e você".
Ele cheirava forte -sujo e estragado, " sob o mesmo nós".
"dois, sóis/sob o mesmo pôr"
Ana abriu os olhos pesados, veria todos os defeitos dele, um a um, uma soma extraordinária.
Em números altos podia xingá-lo de:
Tudo de errado com o que tinha nascido!
Queria que fosse o pai do seu filho, com ele teria menino. Só podia estar louca..."- o enigma do amor - do sol"
- A pele é o maior órgão do corpo humano. -"onde todo contorno finda" -diferentes cores e texturas, morder até machucar - feriu o lábio inferior.
Como controlar as batidas do coração?
Ele dormia de boca aberta.
Iria xingá-lo de:
Babão! - se ele dissesse qualquer coisa.
Saliva misturada com suor e lágrima - o olho lacrimejava de sono e raiva, "estamos/sob a mesma pálpebra".
Turvo e escuro demais pra ver os defeitos dele.
"agora já e ainda"
Ele dormia sem sentimento.
Xingaria de:
Não me importo!
Ele não se importava, mesmo ("intactos de aurora")
O desejo dela, não vermelho, mas preto.

6.14.2005

num confuso casarão

"My world it moves so fast today
The past it seems so far away
And life squeezes so tight that I can't breathe
And every time I try to be what someone else has thought of me
So caught up I wasn't able to achieve
But deep in my heart the answer it was in me
And I made up my mind to define my own destiny
I look at my environment
And wonder where the fire went
What happened to everything we used to be
I hear so many cry for help
Searching outside of themselves
Now I know his strength is within me
And deep in my heart, the answer it was in me
And I made up my mind to define my own destiny
And deep in my heart...
And deep in my heart, the answer it was in me
And I made up my mind to define my own destiny"
(lauryn hill)

6.13.2005

"somos quem podemos ser, sonhos que podemos ter"

"Adivinha quem é?"
Mãos de criança mal fecham seus olhos grandes. Sorri.
E Ana abriu os olhos.
O quarto estava vazio. Onde tinha ido parar a irmã a uma hora dessas?
Pantufas de coelho rosa no pé da cama, tentou calçá-las: pequenas demais?
- Pantufas e sapatos de plástico dão chulé! - logo alguém as jogaria fora, agora se lembrava.
Descalça mesmo então.
Não morava naquele apartamento pra sempre - tinha algum futuro distante também.
O chão sujo na sola dos pés, ruído de carpete de madeira descolando - todo som se ouvia.
Ela não parecia estar ali. Irmã?
Correndo ao seu encontro um cachorrinho caramelo cheirava leite bebê, todos tinham mesmo envelhecido.
- Cadê?
O cachorrinho tinha escondido a irmã, trapinho de pano azul e rosa, dentro da sua casinha??!!!
-Vamos!
Corria e batia a cabeça na parede escorregando. Bater a cabeça na parede com certeza existe.
Aqui não está.
A porta do banheiro rangendo: saiu de dentro muito arrumada.
(Não) era uma provocação, mas iria embora de qualquer jeito.
Quem quer vir?
Nenhum objeto se mexeu.
O cachorrinho só se fosse no colo.
A porta do banheiro rangeu entreabrindo: em cima da cadeirinha de madeira e fórmica- ponta dos pés - pra poder alcançar o olhar no espelho.
Batom vermelho de moranguinho borrou o rosto todo, passava a mão pra tirar, espalhando.
- Brincar de princesa irmã?
Queria.
Ficou pra sempre mais bonita.

6.07.2005

É PRECISO PARAR

"Estou com saudade de mim. Ando pouco recolhida, atendendo demais ao telefone, escrevo depressa, vivo depressa. Onde está eu?
Preciso fazer um retiro espiritual e encontrar-me enfim - enfim, mas que medo - de mim mesma".

(Clarisse Lispector)

6.06.2005

mês castigo

Ana abriu os olhos, e fechou.
O casarão crescia para baixo, subsolo, refeitório e pátio interno - a luz que chegava era sufiente, vinha de cima, mas como não havia olhado não sabia dizer a fonte.
Crianças e velhos descem primeiro. Não era criança e nem velha, sentiu a força que devia à sua idade -plena (?) - e medo.
A entrada ou era de extensas portas e janelas de vidro, ou estava escancarada.
Ana abriu os olhos. O que você quer do mundo? Dormir o dia inteiro, uma visita querida e confortável no começo da noite e já teria feito alguma coisa.
E fechou.
Do lado de fora eram fantasmas fantasiados querendo entrar. Era perigo ou brincadeira? Se as janelas estavam abertas ou eram vidro de quebrar, quem os mantinha lá fora? Não conseguia parar de olhar.
Esse escudo invisível quanto durava nela, e além dela?
Alguém chamou seu nome, a mão no ombro era uma amiga de infância.
Ana abriu os olhos, agora, saiu da cama em coisa parecida com sobressalto.
O corpo é que dizia o real? Muitas roupas no mesmo cabide.
O passado é confuso porque continua a existir.

6.03.2005

num confuso casarão

Não tenho tanta certeza de que esse comentário deveria estar nessa coluninha, considerei que assim fosse porque querendo ou não levo tudo pra casa, porque vou pra casa no fim e porque pode (sim, não é?) ser de opinião compartilhada pelos que lá também moram e/ou dormem. E porque acho que o corpo tb pode ser confuso casarão, não é?
Num segundo de lucidez (?), o que ele fala não se escreve e o que digo não se ouve (ouça).

6.02.2005

CONTAGEM REGRESSIVA

SEMANA JORGE DREXLER

Com algum atraso, mas ainda em tempo... a música de hoje é:

730 DÍAS
No hay rincón en esta casa
que no te haga regresar.
Cada grano de memoria
y la casa es un arenal.
Fui a tus playas por el día,
Y allí me quedé dos años.
Fui lamiendo tus heridas,
Fuiste dándome un remanso
A la sombra de tu luna, se acunó mi corazón.
Se borraron mis arrugas, mi casa se iluminó.
Germinaron más canciones,
De las que yo merecía.
Se paró el reloj de arena...
730 días.